17/04/2010

Olha pra mim


Sexta-feira, 05 de abril de 2002. Apenas mais um dia para o pequeno notável Getúlio. Exagero quando digo notável, ninguém se importava com sua presença, pelo menos era o que ele pensava.
Tinha apenas 13 anos e se perdia em seus pensamentos...
Morava no interior de São Paulo e vivia com a mãe, o pai e mais cinco irmãos.
Era o mais velho, era respeitoso e parecia responsável. Quase nunca abria a boca para dizer o que pensava, o que sentia, o que queria...
Tinha medo de ser repreendido. Mas tinha razão de ter medo? Não se sabe...
Na escola Getúlio era isolado, não participava e não tinha ambição. Seus colegas queriam ser médicos, advogados, engenheiros, famosos... Mas Tulhinho, como dizia sua eterna avó que já se fora, só desejava ser grande o bastante para ser visto.
Olga tentava ser uma boa mãe, e até conseguia. Mas não percebia o abismo que se criava em seu filho mais velho. Por ser mais velho, Olga entendia que Getúlio não precisava de tanta atenção como os outros. Ledo engano.
Getúlio ia ao riacho que tinha perto de sua casa e se imagina dentro d’água, sem mais de lá sair. A água o chamava para um abraço envolvente, que acalmaria seu coração. Mas Getúlio não sabia nadar. Que ironia, sentia-se como um peixe, mas na água não podia entrar.
Levou tempo para o menino decidir, mas decidiu, e tentou se expressar em um papel:
 “No tempo de ontem não vivi, no tempo de hoje eu não vivo, não posso esperar o amanha mamãe. Eu chorei tanto que descobri que as lágrimas são o caminho para a felicidade, pelo menos assim espero. Passei a vida gritando: - Olha pra mim, olha pra mim... Olha pra mim. Mas ninguém me ouvia, ninguém olhava pra mim.
Agora eu me rendo a mim mesmo e no mar da vida pretendo mergulhar.”
[...]
Sexta-feira, 26 de abril de 2002. Um menino de 13 anos foi encontrado morto num riacho do interior de São Paulo. A causa da morte foi afogamento e há suspeita de suicídio.
Olga derramava lágrimas de sangue das suas faces no velório de Tulhinho. Sentia-se culpada pela morte do filho, estava morta por dentro. Com olhos de saudade. Olhou para o rosto pálido do filho e com ternura disse:
- Meu filho, só lamento ser agora, mas eu estou olhando pra você, estou te vendo. Olha pra mim...

(Conto produzido por Luan Barbosa)
Passamos a maior parte da nossa vida olhando, unicamente, para nós mesmos.
Esquecemos que existem pessoas a nossa volta que precisam da nossa atenção, existem pessoas carentes de si mesmas e que gritam por um olhar de afeto. Olhe para aquele ao seu lado e verás que ele tem muito a dizer, você pode impedir que alguém mergulhe nesse mar de sombras.

10 comentários:

  1. Sempre escrevendo de uma forma única, que realmente me toca! Continue assim, seus textos estão melhores a cada dia! :*

    ResponderExcluir
  2. texto chocante ;X .Muito reflexivo afinal ;D

    ResponderExcluir
  3. Nooosa Luh q lindo isso. Sua reflexão foi perfeita... adorei!!!
    Beijocas

    ResponderExcluir
  4. Todo cuidado é pouco para lidar com o ser humano. Quando definimos uma pessoa como tal, podemos nos decepcionar, porque o homem é instável e imprevisivel, sofre mutações. Portanto, é preciso sempre 'olhar e ouvir' o ser humano, e deixá-lo falar. Isso é essencial quando se refere ao relacionamento humano e fundamental para que essas relações resultem em positividade, produzindo auto-estima e autocuidado e não em produtos negativos, como o rompimento dos 'laços relacionais', como intrigas e mortes.


    Luan, liiiinda descrição dessa história real. Como você sabe, não assisto muito jornal, pela falta de tempo até, e por meio de seus pots fico bastante informada, e ganho um bonus ainda, que além das noticias tenho acesso as analises criticas que você tão bem elabora! Parabéns e obrigada neh.. beijãão amore!

    ResponderExcluir
  5. Ta perfeitoo Luh

    ameii =)
    parabéns... continue assim maninho que você ira LONGE.

    ResponderExcluir
  6. Estás ganhando técnica a cada post,nesse inclusive me emocionei, que o futuro nos reserve outras boas surpresas profissionais.

    ResponderExcluir
  7. Adoro seus textos. Estamos sempre por aqui viu Luan.
    Saudades, beijo. Aline Nunes

    ResponderExcluir
  8. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  9. Mais um texto digno de um grande escritor.Parabéns pelo belo conto e,principalmente,por tocar as pessoas em meio a um universo reflexivo e,ao mesmo tempo, real.Continue nesse rio de inspirações,você vai longe...

    ResponderExcluir
  10. Perfeito seu texto.. Você só melhora a cada dia, meu lindo! Até contista é agora..
    :D
    Sou tua fã!
    Saudades ♥

    ResponderExcluir